Começou a sua carreira musical em Portugal mas foi preciso se tornar num “Astronauta” para que o Rapper angolano Nucho, conseguisse alcançar um espaço no universo do Rap nacional.
Recentemente se colocou na pele de muitos órfãos que perderam seus pais na guerra e lançou a música de intervenção social “Filho da Fome” que contou com a participação de Yci Walter.
Por isso fomos ao encontro de Nucho para uma conversa descontraída e ele contou-nos o percurso da sua carreira, sua visão sobre como anda o Rap angolano actualmente, sobre as surpresas que ele prepara para todos os seus seguidores e fãs de sua música e muito mais.
Quem é o Nucho?
Nucho é um angolano que nasceu em Luanda em 1989, uma pessoa que adora a vida e que acredita que ela é para ser vivida com toda alma e essência, tudo para ter um papel positivo no mundo, essencialmente é assim que me defino.
Podes citar algumas das tuas principais músicas e participações de referência?
Como músicas principais, eu acredito que a minha primeira música que posso considerar um grande êxito, e que me levou a ser conhecido pelo público angolano acho que foi o “Astronauta” sem dúvidas, e o “Alambamento“.
No “Alambamento” contei com uma participação de referência, cantei com Duc, e neste álbum tem outras participações de referência, alguns sonhos que eu concretizei, por exemplo na música “Era feliz e não sabia“, conto com a participação de Walter Ananás, na música “Celebra” conto com a participação de Totó, acredito que esses dois grandes nomes vieram enriquecer a minha arte.
Como, quando e porquê começaste a cantar e te interessaste pelo Rap / música?
A música desde cedo esteve na minha vida. Desde muito pequeno comecei a viver no bairro Miratejo, que é um bairro considerado em Portugal como o berço do hip hop tuga, de onde são os Black Company e outros grandes nomes da música portuguesa, então desde miúdo, desde quando eu tinha 10/11 anos comecei a participar de freestyles nas ruas, e depois em 2005 quando estava no ensino secundário, comecei a cantar a sério.
Fundei um grupo que na altura se chamava Tripla Aliança, com o Luso e Glad Max, são rappers que também ainda estão no activo. Começamos a cantar para transmitir os nossos sentimentos, a música começou como nossa terapia, três emigrantes em Portugal, num ambiente difícil, num bairro rodeado de coisas difíceis, desde o racismo, violência policial e drogas, então, basicamente a música serviu como escape para relatar a nossa realidade, as coisas que estávamos a viver no dia-a-dia, o amor, a revolta, a festa com os amigos, a música serviu sempre para expressar a nossa alma.
Fale-nos do processo criativo, composição e gravação do álbum “SOU[L] RAP”?
No álbum SOU[L]RAP comecei a trabalhar com Mr. Mabiala, é um amigo meu de infância, e sempre foi meu produtor desde miúdo, então eu criei uma sonoridade muito associada as músicas que estava habituado a ouvir na altura, Soul, Rap, Jazz e etc. O processo criativo começou essencialmente por ouvir os instrumentais e a criar os temas com que eu estava a viver naquela altura, então foi basicamente receber os beats e escrever por cima deles, depois de terminar o álbum senti que tinha chegado no meu limite criativo e fui ter com Condutor, ele serviu como o Pós-Produtor do meu álbum, voltamos a olhar para todos os temas novamente e tentar olhar para o projecto como um todo e conseguimos.
Houve músicas que retiramos, houve músicas que acrescentamos, houve instrumentais que modificamos e músicas que alteramos, no final de tudo foi um trabalho onde eu senti que a minha essência e a minha alma estavam integralmente representadas, é um álbum que me orgulho bastante e que me valeu uma nomeação para um prémio internacional.
Fazendo uma breve análise, como achas que o hip hop em Angola se encontra?
Eu acho que o Hip-Hop em Angola encontra-se saudável, acho que nunca esteve tão bem, nunca teve esses grupos tão grandes, principalmente os grupos da nova escola, que têm grande aceitação do público e dos organizadores de eventos.
Temos hoje Rappers a viverem integralmente da música, então, acho que é bastante positivo, acho que está a se fazer coisas com bastante qualidade. Acho que agora o próximo passo é criar-se uma indústria onde se consiga rentabilizar melhor a música e falo não só na parte dos cantores, mas começarmos a ter mais produtores a viverem da música, começarmos a ter mais organizadores de eventos, mais bloguers, mais imprensa a dedicar-se exclusivamente ao Hip-Hop, e a viver disso, então eu acho que está saudável, mas que tem um grande espaço por melhorar.
O que que achas que está a faltar dentro do mercado musical em Angola?
Eu acho que está a faltar essencialmente duas coisas:
A primeira é a originalidade, nós somos um país que a nossa música é muito ouvida lá fora, nos PALOP essencialmente, mas não sinto que sejamos originais, principalmente no Rap, eu sinto que estamos sempre a espera da nova tendência que está nos Estados Unidos para começarmos a fazer o nosso Rap. Se estiver na moda cantar como Drake, toda gente vai cantar como Drake, se estiver na moda o Trap, toda gente vai cantar em beats de Trap, se estiver na moda cantar num beat Drill, toda gente vai cantar num beat Drill, se estiver na moda certos movimentos a nível de dança, todo mundo vai fazer aquilo. Então, eu acho que a primeira coisa que falta é originalidade e angolanidade no nosso Rap, porque sinto que a maior parte das músicas aqui Angola não falam da nossa realidade.
A segunda coisa que falta é a maior imparcialidade da imprensa, eu sinto que para alguns é muito mais fácil divulgar os seus trabalhos do que para outros, eu acho que deveria ser mais relacionado com a qualidade de trabalho e não apenas se és meu amigo ou não. Se és do meu núcleo de amigos vou te divulgar bastante, se não és do meu núcleo não vou te divulgar, eu acho que isso não é correto.
Qual é o teu auge a atingir como artista/rapper?
Eu faço música pela arte, eu faço música porque acredito que é o meu legado, é o que me vai tornar imortal, então, eu acho que tem aqui duas maneiras de atingir o auge:
A primeira é a nível pessoal, é sentir que a minha música está a ter um impacto positivo para a mudança no meu país, isso é a primeira coisa, e quando eu sentir efetivamente que estou a contribuir para grandes mudanças no meu país é porque atingi o auge desejado.
A segunda forma de atingir o auge está relacionada com os meus colegas de arte, eu sinto, por exemplo, que atingirei o auge quando tiver o privilégio de cantar com alguém do nível do Paulo Flores, que é um artista que eu amo e que desde miúdo sempre sonhei cantar com ele. Então, acredito que também posso atingir o auge partilhando o estúdio com outros grandes músicos da nossa praça.
Os produtores musicais são extremamente importantes para se obter uma trabalho com qualidade, quais são os Produtores nacionais e internacionais que mais admiras?
É verdade os produtores são muito importantes, é assim:
Eu pelo menos os que mais admiro são os que trabalham comigo, o Condutor é um gênio da música, é um cientista da música, é uma pessoa que eu admiro bastante, e o Mr. Mabiala com quem trabalhei no SOU[L] RAP, é uma pessoa que cresceu comigo a nível musical e que, para mim, sem dúvidas é uma das pessoas mais talentosas a nível de produção que eu conheço. Então, desses dois produtores sou mesmo fã.
Tens sentido alguma contribuição por parte dos rappers da nova escola no que toca as questões sociais?
Eu não quero ser injusto, mas sinceramente não tenho sentido muito. Mas eu também não tenho conhecimento de tudo que acontece no país, por isso não estou a dizer que eles não estão dar contribuição em questões sociais, simplesmente não estou a ver, então se calhar poderia ser mais visível o contributo. Baseando apenas nas músicas, a contribuição tem sido muito pequenas, já nas ações do dia-a-dia, sinceramente desconheço.
Trabalhas? Estudas? Como é que consegues conciliar a carreira musical com as demais actividades?
Eu trabalho, sou consultor de negócios, como licenciado em gestão trabalho nessa área já há quase 10 anos, tenho assessorado alguns negócios a nível internacional, principalmente na parte estratégica, na parte do modelo de negócio.
A forma que tenho de conciliar isso com a minha atividade artística é essencialmente ter uma agenda extremamente organizada, planear bem a minha semana, e dá para fazer tudo. E depois no dia-a-dia ser eficaz e eficiente, estar sempre concentrado e fazer as coisas no tempo que tenho de fazer, sem ter que chegar atrasado aos compromissos, sem demorar demasiado tempo nas reuniões, fazendo os meus trabalhos durante o horário que tenho de fazer e pronto, quando as coisas são assim, tu consegues ser produtivo durante o dia.
Quem é o Nucho quando não está a fazer música?
É assim, eu sou sempre o mesmo, o Nucho músico não é diferente do Nucho pessoa. Tento ser uma pessoa tranquila, uma pessoa que utiliza o seu tempo com qualidade, tentando sempre evoluir em tudo que faz, tentando aprender sempre a cada dia, sou uma pessoa curiosa, essencialmente sou uma pessoa de família, os meus dias a maior parte das vezes são passados com a minha mulher e com o meu filho, não gosto muito de confusões.
O que que podemos esperar do Nucho este ano de 2021?
Para 2021, o que se pode esperar ainda de mim é o vídeo clipe do “Filho da fome”, já foi gravado, está neste momento a ser editado e depois o lançamento do álbum “Origens”, que estamos neste momento a trabalhar na parte gráfica, e até o final do ano, acredito conseguir lançar o álbum. Então, podem esperar coisas boas.
Para conhecer mais sobre o trabalho musical de Nucho, aceda o link abaixo.